Apocalipse, Capítulo 9 Explicado

O mundo muçulmano na profecia (continuação das sete trombetas)

Versículo 1 — “E o quinto anjo tocou a trombeta, e vi uma estrela que do céu caiu na terra; e foi-lhe dada a chave do poço do abismo.”

    A quinta trombeta — Para interpretar esta trombeta recorremos de novo aos escritos de Keith. Diz o notável escritor: 

“Dificilmente se poderá ver um acordo tão uniforme entre os intérpretes acerca de qualquer outra parte do Apocalipse como acerca da aplicação da quinta e sexta trombetas, ou seja, do primeiro e segundo ais, aos sarracenos [86] e aos turcos. É tão clara que dificilmente poderá ser mal compreendida. Em vez de um versículo ou dois designando cada um destes povos, todo o capítulo 9 do Apocalipse, em partes iguais, é ocupado por uma descrição de ambos.

“O império romano caiu como se levantara, pela conquista, mas os sarracenos e os turcos foram os instrumentos pelos quais uma falsa religião se tornou o flagelo de uma igreja apóstata. Por isso, em vez de a quinta e sexta trombetas serem designadas, como as primeiras, apenas por esse nome, são chamadas ais. [...]

Constantinopla foi sitiada, pela primeira vez, depois da extinção do império romano do Ocidente, por Cósroes [II], rei da Pérsia.” [87]

    Diz o profeta: “Vi uma estrela caída do céu na terra. E foi-lhe dada a chave do poço do abismo.”  
    O historiador diz acerca daquele tempo:

“Enquanto o monarca persa contemplava as maravilhas da sua arte e poder, recebeu uma epístola de um obscuro cidadão de Meca, convidando-o a reconhecer Maomé como o apóstolo de Deus. Ele rejeitou o convite e rasgou a epístola. ‘Assim – exclamou o profeta árabe – Deus rasgará o reino e rejeitará a súplica de Cósroes.’ Dos limites destes dois impérios do Oriente, Maomé observa com secreta alegria o progresso de destruição mútua. No meio dos triunfos persas aventurou-se a predizer que não decorreriam muitos anos sem que a vitória voltasse de novo para os estandartes dos romanos. “No tempo em que se diz ter feito esta predição nenhuma profecia podia estar mais longe de se cumprir, pois que os primeiros doze anos de Heráclio anunciavam a próxima dissolução do império.” [88]

    Esta estrela não caiu num só lugar, como a que representava Átila, mas caiu na Terra.

“Cósroes subjugou as possessões romanas na Ásia e na África. E o Império Romano, nesse período, estava reduzido às muralhas de Constantinopla com o resto da Grécia, Itália e África, e algumas cidades marítimas da costa asiática, desde Tiro e Trebizonda. [...] A experiência de seis anos persuadiu por fim o monarca persa a renunciar à conquista de Constantinopla e a especificar o tributo anual do resgate do império romano: mil talentos de ouro, mil talentos de prata, mil vestidos de seda, mil cavalos e mil virgens. Heráclio subscreveu estas ignominiosas condições. Mas o tempo e o espaço que ele ocupou para coletar estes tesouros da pobreza do Oriente foram laboriosamente empregados na preparação de um ousado e desesperado ataque.” [89]

“O rei da Pérsia desprezou o obscuro sarraceno e escarneceu da mensagem do pretenso profeta de Meca. Nem mesmo a derrocada do Império Romano teria aberto uma porta ao maometismo, ou ao progresso dos armados propagadores sarracenos de uma impostura, embora o monarca dos persas e chagán dos ávares (o sucessor de Átila) tivessem dividido entre si o que restava do reino dos césares. O próprio Cósroes caiu. As monarquias persa e romana exauriram mutuamente a sua força. E antes de ser posta uma espada nas mãos do falso profeta ela foi arrebatada das mãos daqueles que teriam detido a sua carreira e esmagado o seu poder.” [90]

“Desde os dias de Cipião e Aníbal nenhuma empresa mais audaz fora tentada do que a que Heráclio realizou para a libertação do império. [...] Explorou seu perigoso caminho através do Mar Negro e das montanhas da Armênia, penetrou no coração da Pérsia e desafiou os exércitos do grande rei a defender o seu ensanguentado país. [...]

Na batalha de Nínive, ferozmente travada desde a aurora até às onze horas, vinte e oito estandartes, além dos que puderam ser quebrados ou rasgados, foram tomados aos persas. A maior parte do seu exército foi trucidada, e os vencedores, ocultando as suas próprias perdas, passaram a noite no campo. As cidades e os palácios da Assíria foram abertos pela primeira vez aos romanos.” [91]

“O imperador não se fortaleceu com as conquistas realizadas. Um caminho se abriu ao mesmo tempo, e pelos mesmos meios, para as multidões de sarracenos que, como os gafanhotos da mesma região, propagando em sua carreira o tenebroso e falaz credo maometano, rapidamente se espalharam pelos impérios persa e romano. Não podia desejar-se mais completa ilustração deste fato do que a apresentada nas palavras finais do capítulo de Gibbon, de que são extraídos os períodos precedentes.” [92]

“Apesar de se ter formado, sob o estandarte de Heráclio, um exército vitorioso, o esforço ingente parece mais ter esgotado do que exercitado a sua força. Enquanto o imperador triunfava em Constantinopla ou Jerusalém, uma obscura cidade dos confins da Síria era pilhada pelos sarracenos, que trucidaram algumas tropas que vinham em sua defesa, ocorrência ordinária e banal se não tivessem sido o prelúdio de uma poderosa revolução. Esses salteadores eram os apóstolos de Maomé. Seu frenético valor tinha emergido do deserto, e nos últimos oito anos do seu reinado Heráclio perdeu para os árabes as mesmas províncias que tinha conquistado aos persas.” [93]

“‘O espírito de fraude e fanatismo, cuja morada não é no Céu’, foi deixado à solta na Terra. Apenas faltava uma chave para abrir o poço do abismo, e essa chave foi a queda de Cósroes. Ele havia rasgado com desprezo a carta de um obscuro cidadão de Meca. Mas quando do seu ‘resplendor de glória’ desceu para a ‘torre de trevas’ que nenhum olho podia penetrar, o nome de Cósroes tinha de passar depressa ao esquecimento diante do de Maomé. O crescente parecia aguardar apenas a queda da estrela para se erguer. Cósroes, após seu completo fracasso e perda do império, foi assassinado no ano 628, e o ano 629 é assinalado pela ‘conquista da Arábia’ e pela ‘primeira guerra dos maometanos contra o império romano’. ‘E o quinto anjo tocou a sua trombeta, e vi uma estrela que do céu caiu na Terra; e foi-lhe dada a chave do poço do abismo. E abriu o poço do abismo.’ Caiu na Terra. Quando se exauriu a força do império romano e o grande rei do Oriente caiu morto na sua torre de trevas, a pilhagem de uma obscura cidade nos confins da Síria foi o ‘prelúdio de uma poderosa revolução’. ‘Os salteadores eram os apóstolos de Maomé’ e seu frenético valor tinha emergido do deserto.” [94]

    O abismo — A palavra grega [abyssos] da qual provém a palavra portuguesa “abismo”, significa “profundo, sem fundo”, e pode referir-se a qualquer lugar devastado, solitário e inculto. É aplicada à Terra no seu estado original de caos (Gên. 1:2). Neste caso pode com propriedade referir-se às desconhecidas planícies do deserto arábico, de cujos confins irromperam as hordas dos sarracenos, como nuvens de gafanhotos. A queda de Cósroes II, rei da Pérsia, pode bem simbolizar a abertura do abismo, no sentido de ter preparado o caminho para os discípulos de Maomé saírem do seu obscuro país, e propagarem suas enganadoras doutrinas a ferro e fogo, até que espalharam as suas trevas sobre todo o império do Oriente.

Versículo 2 — “E abriu o poço do abismo, e subiu fumaça do poço como a fumaça de uma grande fornalha e, com a fumaça do poço, escureceu-se o sol e o ar.”

“Como os nocivos e até mortais vapores que os ventos, em particular os do sudoeste, espalham na Arábia, o maometismo espalhou daí a sua pestilenta influência. Levantou-se tão rapidamente e espalhou-se tanto como o fumo que se levanta de um poço, o fumo de uma grande fornalha. E este um adequado símbolo da religião de Maomé, em si mesma, ou comparada com a forte luz do Evangelho de Jesus. Não foi, como a última, uma luz que desceu do Céu, mas uma fumaça que subiu do poço do abismo.” [95]

Versículo 3 — “E da fumaça vieram gafanhotos sobre a terra; e foi-lhes dado poder como o poder que têm os escorpiões da terra.”

“Levantou-se uma religião falsa que, constituindo embora o flagelo de transgressões e idolatria, encheu o mundo de trevas e erros. Bandos de sarracenos, como gafanhotos, infestaram a Terra, rapidamente estendendo os seus flagelos sobre o império romano desde o Oriente até o Ocidente. A saraiva Desceu das gélidas praias do Báltico. O monte a arder foi lançado da África sobre o mar, e os gafanhotos (apropriado símbolo dos árabes) partiram da Arábia, sua região natal. Vieram como destruidores, propagando a nova doutrina, instigados à rapina e violência por motivos de interesse e religião.” [96]

“Encontramos uma ilustração mais específica ainda do poder que lhes foi dado, no poder que têm os escorpiões da Terra. Não só era o seu ataque fulminante e vigoroso, mas ‘a sensibilidade da honra, que tolera menos o insulto do que a ofensa corporal, lançou um mortal veneno nas contendas dos árabes. Uma ação indecente, uma palavra de desprezo só podem ser expiadas pelo sangue do ofensor, e tal é a sua inveterada paciência, que aguardam meses e anos inteiros a oportunidade de vingança.” [97]

Versículo 4 — “E foi-lhes dito que não fizessem dano à erva da terra, nem a verdura alguma, nem a árvore alguma, mas somente aos homens que não têm na testa o sinal de Deus.”

    Depois da morte de Maomé sucedeu-lhe no comando Abu-Becre, em 632, que, logo depois de bem estabelecida a sua autoridade e governo, dirigiu uma carta circular às tribos árabes, da qual destacamos o seguinte extrato:

“Quando travardes as batalhas do Senhor, portai-vos como homens, nunca voltando as costas, mas que a vossa vitória não seja manchada com o sangue de mulheres e crianças. Não destruais as palmeiras nem queimeis as searas. Não corteis árvores frutíferas, nem maltrateis os animais, a não ser que os tenhais de matar para vosso sustento. Quando fizerdes alguma aliança ou contrato, permanecei-lhe fiéis, e não falteis à vossa palavra. Encontrareis, no vossocaminho, algumas pessoas religiosas que vivem retiradas em mosteiros, e que desse modo se propõem servir a Deus. Deixai-as e não as mateis nem destruais seus mosteiros. E encontrareis outra classe de pessoas que pertencem à sinagoga de Satanás, e que têm coroas rapadas; fendei-lhes os crânios e não lhes deis descanso até que se tornem maometanos ou paguem tributo.” [98]

“Não se diz na profecia nem na história que os conselhos mais humanos tenham sido tão exemplarmente obedecidos como a ordem feroz, mas o fato é que lhes foi assim mandado. E as instruções precedentes são as únicas apresentadas por Gibbon, como dadas por Abu-Becre aos chefes cujo dever era transmitir as ordens a todas as hostes de sarracenos. Essas ordens concordavam tanto com a predição, que dir-se-ia que o próprio califa agiu cientemente em obediência direta a um mandado mais elevado do que o do homem mortal. No próprio ato de partir para a luta contra a religião de Jesus e para a propagação do maometismo em seu lugar, repetiu as palavras que no Apocalipse de Jesus Cristo se encontrava predito que ele havia de dizer.” [99]

    O selo de Deus nas suas frontes — Nas observações feitas a Apocalipse 7:13 demonstramos que o selo de Deus é o sábado do quarto mandamento. A história não omite o fato da existência de observadores do verdadeiro sábado através de toda a era cristã. Mas alguns têm aqui feita a pergunta: Quem eram os homens que naquele tempo tinham o sinal de Deus em suas frontes, e portanto iam ficar livres da opressão maometana? Recorde o leitor o fato, a que já aludimos, de que através de toda a era cristã tem havido pessoas com o selo de Deus em suas frontes, ou seja, que observaram inteligentemente o verdadeiro sábado. Considere ainda que o que a profecia assegura é que os ataques desta assolador poder, os sarracenos, não são dirigidos contra eles, mas contra outra classe. O assunto fica assim liberto de toda a dificuldade, porque isto é tudo o que a profecia realmente afirma. Só uma classe de pessoas é diretamente apresentada no texto, a saber, as que não têm o selo de Deus nas suas frontes. A preservação dos que têm o selo de Deus é apenas implicitamente introduzida. E, com efeito, não nos consta da história que algum deles tenha sido envolvido em qualquer calamidade infligida pelos sarracenos aos objetos do seu ódio. Foram enviados contra outra classe de homens. A destruição que viria sobre essa classe de homens não é apresentada em contraste com a conservação de outros homens, mas apenas com a dos frutos e verdura da terra. Assim, foi-lhes dito que não fizessem dano à erva da terra, nem a verdura alguma, mas apenas a uma certa classe de homens. Em cumprimento temos o estranho espetáculo de um exército de invasores poupando coisas que tais exércitos geralmente destroem: a face e as produções da Natureza. Em obediência à sua permissão de danificar os homens que não tivessem o selo de Deus em suas frontes, fendiam o crânio de uma classe de fanáticos com coroas rapadas, que pertenciam à sinagoga de Satanás. Estes eram sem dúvida uma classe de monges, ou alguma outra divisão da Igreja Católica Romana.

Versículo 5 — “E foi-lhes permitido, não que os matassem, mas que por cinco meses os atormentassem; e o seu tormento era semelhante ao tormento do escorpião quando fere o homem.”

“Suas constantes incursões no território romano e frequentes assaltos à própria Constantinopla, constituíram um incessante tormento para o império. Apesar disso não puderam eficazmente subjugá-lo, não obstante o longo período, a que depois se alude mais diretamente, durante o qual continuaram por incessantes ataques a afligir uma igreja idólatra, cujo chefe era o papa. Sua missão era atormentar e depois danificar, mas não matar ou completamente destruir. O que é para admirar é que eles o não fizessem.” [100] (Acerca dos cinco meses, veja-se o versículo 10).

Versículo 6 — “E naqueles dias os homens buscarão a morte e não a acharão; e desejarão morrer, e a morte fugirá deles.”

“Os homens cansavam-se de viver, quando a vida era poupada só para renovação da dor, e quando tudo quanto reputavam sagrado era violado, e todos quantos prezavam estavam em constante perigo, e os selvagens sarracenos dominavam sobre eles, ou os deixavam só para um repouso momentâneo, sempre em perigo de ser súbita ou violentamente interrompido, como que pela ferroada de um escorpião.” [101]

Versículo 7 — “E o aspecto dos gafanhotos era semelhante ao de cavalos aparelhados para a guerra; e sobre a sua cabeça havia umas como coroas semelhantes ao ouro; e o seu rosto era como rosto de homem.”

“O cavalo árabe é o que leva a dianteira em todo o mundo, e perícia em equitação é a arte e ciência da Arábia. Os bárbaros árabes, ligeiros como gafanhotos e armados como escorpiões, prontos a arremessarem-se num momento, estavam sempre preparados para a batalha. 

‘E sobre as suas cabeças havia umas coroas semelhantes ao ouro.’ Quando Maomé entrou em Medina (622 d.C.), e pela primeira vez foi recebido como seu príncipe, ‘um turbante foi desfraldado à sua frente para suprir a falta de estandarte.’ Os turbantes dos sarracenos, semelhantes a uma coroa, eram o seu ornamento e o seu orgulho. As ricas pilhagens, que eles renovavam com frequência, abasteciam-nos abundantemente. Passar a usar o turbante corresponde proverbialmente a fazer-se muçulmano. E os árabes eram antigamente distinguidos pelas mitras que traziam.” [102]

“E os seus rostos eram como rostos de homens.” “A gravidade e firmeza de ânimo [do árabe] é notável nas suas maneiras exteriores. [...] O seu único gesto consiste em preservar a barba, venerável símbolo de virilidade. [...] A honra das suas barbas é muito fácil de ferir.” [103]

Versículo 8 — “E tinham cabelos como cabelos de mulher, e os seus dentes eram como de leão.”

“As mulheres consideram os cabelos compridos como um adorno. Os árabes, ao contrário dos outros homens, tinham o cabelo como o das mulheres, ou seja, por cortar, costume este registrado por Plínio e por outros. Mas nada havia de efeminado no seu caráter. Com efeito, como que significando sua ferocidade e força para devorar, seus dentes eram como de leões.” [104]

Versículo 9 — “E tinham couraças como couraças de ferro; e o ruído das suas asas era como o ruído de carros, quando muitos cavalos correm ao combate.”

    A couraça — “A couraça era usada pelos árabes nos dias de Maomé. Na batalha de Ohud (a segunda que Maomé travou) com os coraixitas de Meca (624 d.C.), ‘setecentos deles estavam armados com couraças’.” [105]
    O barulho de suas asas“O ataque dos árabes não se apoiava, como o dos gregos, nos esforços de uma firme e compacta infantaria. Sua força militar era principalmente constituída por cavalaria e arqueiros. A um toque da mão os cavalos árabes arremessavam-se com a rapidez do vento. ‘O barulho das suas asas era como o barulho dos carros, quando muitos cavalos correm ao combate.’ Suas conquistas foram maravilhosas tanto em rapidez como em extensão, e seu ataque era instantâneo. Nem foi menos eficiente contra os romanos do que contra os persas.” [106]

Versículos 10 e 11 — “E tinham cauda semelhante à dos escorpiões e aguilhão na cauda; e o seu poder era para danificar os homens por cinco meses. E tinham sobre si rei, o anjo do abismo; em hebreu era o seu nome Abadom, e em grego, Apoliom.”

    “Causa dano aos homens por cinco meses.” — Levanta-se a questão: Que homens eles danificariam por cinco meses? Certamente os mesmos que depois haviam de matar (ver o verso 15), “a terça parte dos homens”, ou a terça parte do Império Romano — a sua divisão grega.
    Quando começariam a sua obra de tormento? O versículo 11 responde à pergunta.     
    “Tinham sobre eles, como seu rei”. Desde a morte de Maomé, até perto do fim do século XIII, os maometanos estiveram divididos em várias facções sob diversos chefes, sem um governo civil geral, que se estendesse sobre todos. No fim do século XIII, Otman fundou um governo ou império, que cresceu até se estender sobre quase todas as principais tribos maometanas, consolidando-as numa grande monarquia. 
    Seu rei se chama o “anjo do abismo”. Um anjo significa um mensageiro, um ministro, bom ou mau, e nem sempre um ser espiritual. O “anjo do abismo” seria o principal ministro da religião que saiu dele, quando foi aberto. Essa religião é o maometismo, e o sultão é o seu principal ministro.
    Seu nome em hebraico é “Abadom”, o destruidor; em grego “Apoliom”, o exterminador, ou destruidor. Com dois diferentes nomes em duas línguas, é evidente que se pretende representar mais o caráter do que o nome do poder. Sendo assim, ele é representado nas duas línguas como destruidor. Tal tem sido sempre o caráter do governo otomano. 
    Mas quando é que Otman fez o seu primeiro assalto ao império grego? Segundo Gibbon,

“Foi no dia vinte e sete de julho, no ano de 1299 da era cristã, que Otman invadiu pela primeira vez o território de Nicomédia; e a singular exatidão da data parece revelar alguma predição da rapidez e do movimento destruidor do monstro.” [107]

    Von Hammer, o escritor alemão da Turquia, bem como outros autores fixam este acontecimento em 1301. Mas qual data é testemunhada pelas fontes históricas da época? Paquimeres [108] é um historiador eclesiástico e secular que nasceu em Niceia, cidade localizada na região invadida por Otman, e escreveu sua história precisamente durante esse período, pois concluiu sua obra por volta de 1307, de maneira que era contemporâneo de Otman. 
    Petri Possini, em 1669, elaborou uma cronologia completa da história de Paquimeres, dando as datas dos eclipses da lua e o sol, como também outros eventos registrados por Paquimeres em sua obra. Quanto à data de 1299, Petri Possini diz:

“É agora a nossa tarefa de dar uma data fundamental e exata ao Império Otomano. Tentaremos efetuar isto através de uma tríplice comparação das datas oferecidas pelos cronologistas árabes e pelo testemunho de nosso ‘Paquimeres’. Este autor mencionado nos relata no quarto livro desta segunda parte, capítulo 25, que Atman (nome grego equivalente a Otman) se tornou forte ao assumir um bando de guerreiros audazes e enérgicos da Paflagônia. Quando Muzalo, o comandante do exército romano, tentou bloquear seu avanço, Otman o derrotou em uma cidade perto de Nicomédia, capital da Bitínia. O senhor da batalha considerou esta cidade dali por diante como estando vencida. E, Paquimeres é bem explícito em declarar que estes acontecimentos tiveram lugar nas vizinhanças imediatas de Bafeum, não longe da Nicomédia, no dia 27 de julho. O ano, nós asseguramos em nossa sinopse, ser o ano de 1299 de nosso Senhor, depois de compararmos cuidadosamente os acontecimentos.” [109]

    A sinopse a que se refere Petri Possini, quanto à data em que os da Paflagônia se uniram com as forças de Otman, o que ocorreu em 27 de julho de 1299 da era cristã, o quinto ano do Papa Bonifácio VIII e o sexto de Miguel Paleólogo. A declaração é a seguinte:

“Atman [Otman], o sátrapa dos persas, também chamado Osman, fundador da ainda reinante dinastia dos turcos, fortaleceu-se ao reunir um grande número de terríveis bandidos da Paflagônia.” [110]
 
    Os da Paflagônia, sob os filhos de Amurio, uniram-se a Otman em seu ataque do dia 27 de julho, de maneira que duas vezes Posino, para o evento, nos oferece a data de 1299.
    Gregoras, também contemporâneo de Otman, apóia a Gibbon e Pachymeres, ao estabelecer a data de 1299 em seu relato da divisão da Anatólia. A divisão entre dez emires turcos ocorreu em 1300, segundo historiadores fidedignos. Gregoras declara que divisão Otman recebeu o Olimpo e outras partes da Bitínia, o que indica que Otman já tinha lutado a batalha de Bafeum e tinha conquistado certas partes daquele território greco-romano. 

Os cálculos de alguns escritores têm levado a supor que o período devia começar com a fundação do Império Otomano, mas é evidentemente um erro, porque não só deviam ter sobre si um rei, mas haviam de atormentar os homens durante cinco meses. Porém, o período de tormenta não podia começar antes do primeiro ataque dos atormentadores, que foi, como vimos, em 27 de julho de 1299 (Josiah Litch, Prophetic Exposition, vol. 2, p. 180).  (Retirado na versão da vida plena)

    O cálculo que se segue, fundado neste ponto de partida, foi feito e publicado numa obra intitulada Christ’s Second Coming (A Segunda Vinda de Cristo) por Josiah Litch, em 1838.

“‘E o seu poder era para danificar os homens por cinco meses’. Até aqui sua missão consistia em atormentar por constantes depredações, mas sem matá-los politicamente. ‘Cinco meses’ [cada mês com trinta dias são 150 dias], quer dizer cento e cinquenta anos, começando em 27 de julho de 1299, mais o acréscimo dos cento e cinquenta anos, chega-se a 1449. Durante todo esse período os turcos estiveram empenhados numa guerra quase contínua com o Império Grego, porém sem o conquistar. Chegaram a tomar várias províncias gregas, mas a independência grega era ainda mantida em Constantinopla. Em 1449, porém, operou-se uma mudança” [111]

    Esta história se encontrará sob a trombeta seguinte, a de número seis.

Versículos 12-15 — “Passado é já um ai; eis que depois disso vêm ainda dois ais. E tocou o sexto anjo a trombeta, e ouvi uma voz que vinha das quatro pontas do altar de ouro que estava diante de Deus, a qual dizia ao sexto anjo, que tinha a trombeta: Solta os quatro anjos que estão presos junto ao grande rio Eufrates. E foram soltos os quatro anjos que estavam preparados para a hora, e dia, e mês, e ano, a fim de matarem a terça parte dos homens.”

    A sexta trombeta —

“O primeiro ai devia prolongar-se desde o aparecimento do Islã até o fim dos cinco meses. Devia terminar então o primeiro ai, e principiar o segundo. E quando o sexto anjo tocou, foi-lhe mandado que tirasse as restrições que lhes tinham sido impostas, pelas quais se limitavam à obra de atormentar os homens e a sua missão era ampliada a ponto de se lhes permitir matar a terça parte dos homens. Esta ordem veio das quatro pontas do altar de ouro.” [112]

    Os quatro anjos — Esses são os quatro principais sultanatos de que se compunha o Império Otomano, localizados nas terras banhadas pelo grande rio Eufrates. Esses sultanatos estavam situados em Alepo, Icônio, Damasco e Bagdá. Anteriormente estiveram retidos, mas agora Deus dera a ordem, e foram soltos.
    No ano de 1449, ao aproximar-se o final do período de 150 anos, faleceu João Paleólogo, sem deixar filhos que herdassem o trono do Império Oriental. Seu irmão Constantino, herdeiro legítimo, não se atreveu a subir ao trono sem o consentimento do sultão turco. Por isso enviou embaixadores a Adrianópolis, receberam a aprovação do sultão, e voltaram com presentes para o novo soberano. A princípios de 1449, sob tão pomposas circunstâncias, foi coroado o último imperador grego.
    O historiador Gibbon assim relata o fato em sua obra monumental:

Com a morte de João Paleólogo, [...] a família real, pela morte de Andrônico e a profissão monástica de Isidoro, ficou reduzida a três príncipes: Constantino, Demétrio e Tomás, filhos sobreviventes do imperador Manuel. O primeiro e o último achava-se longe, em Moréia. [...] A imperatriz mãe, o senado e os soldados, o clero e o povo, unânimes apoiaram o sucessor legítimo; e o déspota Tomás, que ignorando a mudança, voltou acidentalmente à capital, pô-se a defender com energia os interesses do irmão ausente. Diz-nos o historiador Franza que foi imediatamente enviado um embaixador à corte de Adrianópolis. Amurat o recebeu com honra e o despediu com presentes; mas a misericordiosa aprovação do sultão turco anunciou sua supremacia, e a queda iminente do Império Oriental. As mão dos ilustres deputados, em Esparta, colocaram a coroa imperial sobre a cabeça de Constantino (Edward Gibbon, The Decline and Fall of The Roman Empire, vol. 6, cap. 67, p. 365). (Retirado na versão da vida plena)

“Examinemos cuidadosamente este fato histórico à luz da predição acima apresentada. Não era por um assalto violento feito aos gregos que o seu império havia de ser derrubado e perdida a sua independência, mas pela entrega voluntária e simples dessa independência nas mãos dos turcos. A autoridade e supremacia do poder turco foi reconhecida quando Constantino disse virtualmente: ‘Não posso reinar sem que o permitais’.” [113]

Os quatro anjos foram soltos por uma hora, um dia, um mês e um ano, para matar a terça parte dos homens. Este período, durante o qual devia existir a supremacia otomana, perfaz 391 anos e 15 dias. Assim chegamos a este resultado: Um ano profético são 360 dias proféticos, ou 360 anos literais; um mês profético são 30 dias proféticos, ou 30 anos literais; um dia profético é 1 ano literal; e uma hora, ou 1/24 do ano, ou seja, 15 dias literais; somando tudo temos 391 anos e 15 dias.

“Mas apesar de os quatro anjos serem assim soltos pela voluntária submissão dos gregos, outra ruína aguardava a sede do império. Amurat, o sultão a quem se apresentou a submissão de Constantino VIII, e por cuja permissão este reinou em Constantinopla, morreu pouco depois, sucedendo-lhe, no império, em 1451, Maomé II, que cobiçou Constantinopla e resolveu tomá-la. [...] 

Fez, assim, preparativos para cercar e tomar a cidade. O cerco começou em 6 de abril de 1453 e terminou com a tomada da cidade e a morte do último dos Constantinos, em 16 de maio seguinte. E a cidade oriental dos césares tornou-se a sede do império otomano.” [114]

    As armas e métodos de guerra que foram usados no cerco em que Constantinopla foi tomada foram, como veremos, distintamente notados pelo Revelador.

Versículo 16 — “O número dos exércitos da cavalaria era de vinte mil vezes dez milhares; eu ouvi o seu número.”

“Inumeráveis hordas de cavalos e daqueles que os montavam! Gibbon descreve assim a primeira invasão do território romano pelos turcos: ‘Os miríades de cavalos turcos espalharam-se por uma frente de seiscentas milhas, desde o Tauro a Erzerum, e o sangue de 130 mil cristãos foi um grato sacrifício ao profeta árabe.’ O leitor julgará se esta linguagem se aplica ou não a algum número definido. Alguns supõem que é apresentado duas vezes o número 200 mil, e, segundo alguns historiadores, encontra-se esse número de guerreiros turcos no cerco de Constantinopla. Outros pensam que 200 milhões significam todos os guerreiros turcos durante os 391 anos e 15 dias do seu triunfo sobre os gregos. Nada se pode afirmar, porém, sobre este ponto.” [115]

    Nada se pode afirmar sobre este ponto, nem é essencial.

Versículo 17 — “E assim vi os cavalos nesta visão; e os que sobre eles cavalgavam tinham couraças de fogo, e de jacinto, e de enxofre; e a cabeça dos cavalos era como cabeça de leão; e de sua boca saía fogo, e fumaça, e enxofre.”

    A primeira parte desta descrição talvez se refira ao aspecto desses cavaleiros. Fogo é representado pela cor vermelha, empregando-se com frequência a expressão “vermelho como fogo”; jacinto, o azul; e enxofre, o amarelo. Essas eram as cores que predominavam no vestuário daqueles guerreiros, de sorte que a descrição, segundo esse ponto de vista, condizia bem com o uniforme turco, que era composto em larga escala por vermelho ou escarlate, azul e amarelo. As cabeças dos cavalos eram como cabeças de leões, representando sua força, coragem e ferocidade. Por sua vez a última parte do versículo refere-se, sem dúvida, ao uso de pólvora e armas de fogo para fins guerreiros, uma inovação bem recente para a época. Como os turcos disparavam suas armas de fogo de cima dos cavalos, parecia ao observador distante, num plano horizontal, que o fogo, fumaça e enxofre saíam das bocas dos cavalos. 
    Os comentadores concordam em aplicar a profecia acerca do fogo, fumaça e enxofre, ao uso da pólvora pelos turcos na sua luta contra o Império do Oriente. (Ver as notas sobre Apocalipse 19:17 de Adam Clark, Commentary on the New Testament, vol. 2, p. 1003; Albert Barnes, Notes on Revelation, p. 264; The Cottage Bible, vol. 2, p. 1399). Mas, em geral, apenas se referem aos grandes canhões, empregados por esse poder, mas a profecia menciona especialmente os “cavalos” e o fogo que “saía das suas bocas”, como se fossem usadas armas menores e de cima dos cavalos. Barnes pensa que assim sucedia, e uma frase de Gibbon confirma este parecer. Diz ele: “As incessantes investidas de lanças e dardos eram acompanhadas pelo fumo, o som e o fogo dos seus mosquetes e canhões.” 
    Temos aqui uma boa evidência histórica de que os mosquetes foram usados pelos turcos, e por outro lado é inegável que em suas guerras combatiam principalmente a cavalo. É, portanto, bem apoiada a inferência de que usavam armas de fogo à cavalo, cumprindo exatamente a profecia, segundo a ilustração referida.
    Acerca do uso das armas de fogo pelos turcos na sua campanha contra Constantinopla, Elliot diz o seguinte:

“A morte da terça parte dos homens, isto é, a tomada de Constantinopla e por consequência a destruição do império grego, foi devida ao ‘fogo, fumo e enxofre’, à artilharia e armas de fogo de Maomé. Mais de 1.100 anos tinham já decorrido desde a sua fundação por Constantino. Durante esse tempo, godos, hunos, ávares, persas, búlgaros, sarracenos, russos e os próprios turcos otomanos, tinham feito seus assaltos hostis ou posto cerco contra ela, mas as fortificações eram inexpugnáveis para eles. Constantinopla sobreviveu, e com ela o Império Grego. Daí a ansiedade do sultão Maomé em encontrar o que pudesse remover o obstáculo. Perguntou ao fundidor de canhões que para junto dele desertara: ‘Você consegue fundir um canhão de tamanho suficiente para abater os muros de Constantinopla?’ A fundição foi em seguida estabelecida em Adrianópolis, fundiu-se o canhão, a artilharia foi preparada e iniciado o cerco. 

É digno de nota como Gibbon, sempre inconsciente comentador da profecia do Apocalipse, põe este novo instrumento de guerra no primeiro plano do seu quadro, na sua eloquente e impressionante narrativa da catástrofe final do império grego. Em preparação para ela apresenta a história da então recente invenção da pólvora, ‘dessa mistura de salitre, enxofre e carvão’. Fala do seu primeiro uso pelo sultão Amurat, e também, como já dissemos, da fundição de maiores canhões por Maomé em Adrianópolis. Depois, no progresso do próprio cerco, descreve como ‘as investidas de lanças e dardos eram acompanhadas pela fumaça, o som e o fogo das espingardas e canhões’; como ‘a extensa ordem da artilharia turca fazia fogo contra as muralhas, troando ao mesmo tempo 14 baterias sobre os lugares mais acessíveis’; como ‘as fortificações que durante séculos tinham resistido à hostil violência, agora se desmantelavam por toda parte sob os canhões otomanos, muitas brechas se abriam e, perto da porta de São Romano, quatro torres se desmoronaram’; como, ‘enquanto da linha das galés e da ponte da artilharia otomana fazia fogo para todos os lados, o campo e a cidade, os gregos e os turcos estavam envolvidos numa nuvem de fumaça, que apenas poderia ser repetida pela libertação ou destruição final do império romano’; como ‘as duplas muralhas foram reduzidas pelos canhões a um montão de ruínas’; e como, por fim, os turcos ‘arremessando-se através das brechas’, ‘Constantinopla foi tomada, seu império subvertido, e sua religião pisada pelos conquistadores maometanos.” Repito que é digno de nota como Gibbon atribui, de um modo tão claro e impressionante, a tomada da cidade, e desse modo a destruição do império, à artilharia otomana. Que é isto senão um comentário às palavras da nossa profecia? ‘Por essas três pragas foi morta a terça parte dos homens, isto é, pelo fogo, pela fumaça e pelo enxofre que saía das suas bocas’.” [116]

Versículos 18 e 19 — “Por estas três pragas foi morta a terça parte dos homens, isto é, pelo fogo, pela fumaça e pelo enxofre, que saíam da sua boca. Porque o poder dos cavalos está na sua boca e na sua cauda, porquanto a sua cauda é semelhante a serpentes e têm cabeça, e com ela danificam.”

    Estes versículos exprimem o efeito mortífero do novo modo de guerra introduzido. Foi por meio desses agentes – pólvora, armas de fogo e canhões – que Constantinopla foi finalmente conquistada e entregue às mãos dos turcos.
    Além do fogo, fumaça e enxofre, que pareciam sair das suas bocas, diz-se que o seu poder estava também nas suas caudas. É um fato notável que a cauda do cavalo é um bem conhecido distintivo turco, símbolo de cargo e autoridade. O significado da expressão parece ser que as suas caudas eram o símbolo ou emblema da sua autoridade. A imagem que João viu parece ter consistido de cavalos que lançavam fogo e fumaça, e o que era igualmente estranho, viu que o seu poder de espalhar a desolação estava relacionado com as caudas dos cavalos. Alguém, olhando para um corpo de cavalaria com tais estandartes ou insígnias, ficaria surpreso com este aspecto insólito e notável, e falaria dos seus estandartes como concentrando e dirigindo o seu poder. 
    Esta supremacia dos maometanos sobre os gregos devia continuar, como já vimos, por 391 anos e 15 dias.

“Começando, ao findar os 150 anos, em 27 de julho de 1449, o período devia estender-se até 11 de agosto de 1840. A julgar pela maneira como começou a supremacia otomana, que foi por um voluntário reconhecimento por parte do imperador grego de que reinava só com permissão do sultão turco, devíamos naturalmente concluir que a queda ou perda da independência otomana se efetuaria da mesma forma, que no fim do período indicado [isto é, em 11 de agosto de 1840], o sultão submeteria voluntariamente a sua independência às mãos dos poderes cristãos [117] 

    “Justamente como 391 anos e 15 dias antes, o tinha recebido das mãos do imperador cristão, Constantino XIII.
    Esta conclusão fora tirada e feita esta aplicação da profecia pelo pastor Josias Litch, em 1838, dois anos antes de ocorrer o acontecimento predito. Predisse em tal ano que a potência turca cairia “em algum momento do mês de agosto de 1840” [118], mas poucos dias antes do cumprimento da profecia, ele concluiu mais definidamente que o período concedido aos turcos acabaria em 11 de agosto de 1840. Era questão de cálculo sobre os períodos proféticos da Escritura. Agora, convém perguntar se esses acontecimentos se realizaram segundo o cálculo anterior. O assunto resume-se no seguinte:
    Quando terminou a independência maometana em Constantinopla? — Alguns anos antes de 1840, o sultão tinha-se envolvido em guerra com Mohamed-Ali, paxá do Egito. 

“Em 1838 o litígio entre o sultão e o seu vassalo egípcio fora temporariamente solucionado por influência dos embaixadores estrangeiros. Em 1839, porém, começaram de novo as hostilidades, e prosseguiram até que, numa batalha geral entre os exércitos do sultão e de Mohamed, o exército do sultão foi completamente derrotado e destruído, e a sua frota tomada por Mohamed e levada para o Egito. Tão reduzida ficou a frota do sultão que, quando a guerra começou de novo em agosto, ele tinha apenas dois navios de primeira classe e três fragatas, como tristes vestígios da outrora poderosa frota turca. Mohamed recusou-se terminantemente a abandonar esta frota e a restituí-la ao sultão, e declarou que, se tentassem retomá-la, a queimaria. Assim se encontravam as coisas, quando, em 1840, a Inglaterra, a Rússia, a Áustria e a Prússia intervieram, e determinaram uma solução do conflito, pois era evidente que, se Mohamed fosse deixado à vontade, dentro em breve se apoderaria do trono do sultão.” [119]

    O sultão aceitou essa intervenção das grandes potências, e fez assim uma entrega voluntária do caso em suas mãos. Reuniu-se em Londres uma conferência dessas potências, estando presente o xeque Effendi Bey Likgis como senhor otomano absoluto. Foi elaborado o texto de um acordo que devia ser apresentado ao paxá do Egito, segundo o qual o sultão oferecer-lhe-ia o governo hereditário do Egito, e toda a parte da Síria que se estendia desde o golfo de Suez até o lago de Tiberíades, juntamente com a província de Acre, por toda a vida. Por sua vez evacuaria todas as outras partes dos domínios do sultão então ocupados por ele, e restituiria a frota otomana. Em caso de recusar esta oferta do sultão as quatro potências tomariam o assunto em suas mãos e empregariam todos os outros meios que achassem convenientes.
    É evidente que, logo que este ultimato fosse posto pelo sultão nas mãos de Mohamed-Ali, o assunto estaria para sempre fora do domínio do sultão, e os seus negócios estariam ao dispor, desde esse momento, das mãos de poderes estrangeiros. O sultão enviou Rifat Bey num vapor do governo a Alexandria, para comunicar o ultimato a Mohamed-Ali. Tal ultimato lhe foi entregue em 11 de agosto de 1840. No mesmo dia, em Constantinopla, foi dirigida pelo sultão uma nota aos embaixadores das quatro potências, perguntando que plano devia ser adotado no caso de o paxá recusar cumprir os termos do ultimato, ao que fizeram responder que se tinham tomado providências e não havia necessidade de se alarmar por qualquer contingência que pudesse ocorrer.
    As seguintes citações comprovam os fatos:

“Pelo vapor francês do dia 24, recebemos notícias do Egito datadas do dia 16. Não mostram alteração na resolução do paxá. Confiante na coragem do seu exército árabe e em suas fortalezas que defendem sua capital, parece decidido a permanecer na última alternativa; e como é agora inevitável que recorra a ela pode ser considerada perdida toda a esperança que o assunto seja resolvido sem derramamento de sangue. Logo após a chegada do vapor ‘Cyclops’ com as notícias da convenção das quatro potências, diz-se que Mohamed abandonou Alexandria e fez uma curta viagem ao Baixo Egito. Por sua ausência pensava evitar as conferências com os cônsules europeus, mas principalmente procurar despertar com sua ausência o fanatismo das tribos beduínas e facilitar o recrutamento de novas forças. No intervalo de sua ausência, o vapor do governo turco, que chegara em Alexandria no dia 11, com o enviado Rifat Bey à bordo, ficou por sua ordem, em quarentena, e não foi liberto até o dia 16. Contudo, antes da saída do barco e no mesmo dia do fato, o já nomeado funcionário teve uma audiência com o paxá e lhe disse a ordem do sultão quanto à evacuação das províncias sírias, e foi fixada outra audiência para o dia seguinte quando, em presença dos cônsules das potências europeias, receberia dele sua resposta definitiva, e se lhe informaria a alternativa se recusasse obedecer, e a convenção dava-lhe dez dias para decidir a conduta que considerava adequada seguir.” [120]

    O correspondente do Morning Chronicle, de Londres, em sua comunicação
datada ‘Constantinopla, 27 de agosto, 1840’, diz:

Pouco posso acrescentar à minha última carta sobre os planos das quatro potências; e creio que os detalhes que lhes dei então conformam tudo o que se decidiu até aqui. A porção do paxá, com expus então, não se estenderá além da linha do Acre, e não inclui a Arábia nem Candia. O Egito apenas será herdeiro em sua família, e a província do Acre será governada por seu filho enquanto viver, mas depois dependerá da vontade de la Puerta; e mesmo este último será concedido se aceitar as condições e entregar a frota romana num prazo de dez dias. Em caso de não fazê-lo, sua posse será suprimida. Ser-lhe-á oferecido então só o Egito, com outros dez dias, para decidir antes de usar a força contra ele. Porém, da maneira como empregaria a força, negando-se a cumprir as condições, caberia decidir se apenas a costa lhe seria bloqueada ou se sua capital seria bombardeada e seus exércitos seriam atacados nas províncias sírias; nem tampouco esclarece este ponto uma nota entregue ontem pelos quatro embaixadores, em resposta a uma pergunta feita por la Puerta acerca do plano a adotar-se neste caso. Declara apenas que já se tomaram as medidas necessárias, e que o Diván não precisa alarmar-se acerca de quaisquer contingências que se apresentassem depois (Idem, 3 de setembro, 1840).

    Analisemos as citações anteriores:
    Primeiro — O ultimato chegou a Alexandria em 11 de agosto de 1840.
    Segundo — A carta do correspondente do Morning Chronicle, trazem a data de 12 de agosto de 1840.
    Terceiro — O correspondente declara que a pergunta da Sublime Puerta foi apresentada aos representantes das quatro grandes potências, e a foi recebida “ontem”. De modo que, em sua própria capital, “ontem” a Sublime Puerta dirigiu-se aos embaixadores das quatro potências cristãs da Europa para saber que medidas seriam tomadas com relação a uma circunstância que afetava vitalmente seu império; e lhe foi dito que tinham “tomado as medidas necessárias”, mas não pôde saber quais eram, embora lhe fosse dito que não precisaria alarmar-se “acerca de quaisquer circunstâncias que se pudessem apresentar”. Desde aquele dia “ontem”, que era o 11 de agosto de 1840, as quatro potências cristãs da Europa, e não a Sublime Puerta [o império otomano], iriam lidar com tais contingências. 
    Em 11 de agosto de 1840 terminava o período de 391 anos e 15 dias concedido à duração do poder otomano. E onde estava a independência do sultão? DESAPARECEU! Quem tinha a supremacia do império otomano em suas mãos? As quatro grandes potências; e aquele império tem existido desde então apenas pela tolerância destes poderes cristãos. Assim foi cumprida a profecia ao pé da letra. (Retirado na versão da vida plena)
    Desde a primeira publicação do cálculo desse assunto em 1838, a que já nos referimos, milhares de pessoas observaram com interesse o tempo apresentado para o cumprimento da profecia. E o cumprimento exato do acontecimento predito, mostrando a correta aplicação da profecia, deu poderoso impulso ao grande movimento adventista que então começava a chamar a atenção do mundo.

Versículos 20 e 21 — “E os outros homens, que não foram mortos por estas pragas, não se arrependeram das obras de suas mãos, para não adorarem os demônios e os ídolos de ouro, e de prata, e de bronze, e de pedra, e de madeira, que nem podem ver, nem ouvir, nem andar. E não se arrependeram dos seus homicídios, nem das suas feitiçarias, nem da sua prostituição, nem das suas ladroíces [seus furtos].”

    Deus quer que os homens tomem nota dos Seus juízos e recebam as lições que por eles deseja dar-lhes. Mas quão tardos são em aprender, e quão cegos às indicações da Providência! Os eventos ocorridos sob a sexta trombeta constituíam o segundo ai. Esses juízos, porém, não levaram os homens a melhorar sua conduta moral. Os que deles escaparam nada aprenderam da sua manifestação na Terra. o culto de demônios (homens mortos deificados) e de ídolos de ouro, prata, bronze, pedra e madeira, podem encontrar um cumprimento nos cultos dos santos e das imagens na Igreja Católica Romana. Por outros lado não faltaram homicídios, feitiçarias (pretensos milagres por meios de santos mortos), prostituições e furtos nos países em que prevaleceu a religião romana. (acréscimo da versão vida plena)
    As hordas dos sarracenos e turcos foram soltas sobre a cristandade apóstata como flagelo e castigo. Os homens sofreram o castigo, mas não aprenderam dele nenhuma lição. [121]
Na tomada de Constantinopla — “Os soldados gritavam pela cidade: ‘O Corão ou a morte!’ Outros arrastavam um crucifixo enlameado com as fezes de um soldado do corpo de elite [122] das tropas turcas pela cidade e debochavam: “Vejam aqui o seu Deus, infiéis!” É assim que o justo Juiz do mundo exerceu juízo em Constantinopla por meio dos turcos, como exerceu em Jerusalém pelos caldeus e romanos, e em Roma pelos godos e vândalos.” [123] (acréscimo da versão vida plena)


Referências bibliográficas
[86] Sarraceno: Diz-se de ou indivíduo de povo árabe-berbere que conquistou a península Ibérica; mouro, árabe.
[87] KEITH, Alexander. Signs of the Times, vol. I, pp. 289, 291.
[88] GIBBON, Edward. The Decline and Fall of the Roman Empire, vol. IV, cap. 46, pp. 463, 464.
[89] Ibidem, p. 466.
[90] KEITH, Alexander. Signs of the Times, vol. I, p. 293.
[91] GIBBON, Edward. The Decline and Fall of the Roman Empire, vol. 4, cap. 46, pp. 470- 480.
[92] KEITH, Alexander. Signs of the Times, vol. 1, p. 295.
[93] GIBBON, Edward. The Decline and Fall of the Roman Empire, vol. IV, cap. 46, p. 486.
[94] KEITH, Alexander. Signs of the Times, vol. 1, p. 298.
[95] Ibidem, p. 299.
[96] Ibidem, p. 301.
[97] Ibidem, p. 305.
[98] GIBBON, Edward. The Decline and Fall of the Roman Empire, vol. 5, cap. 51, pp. 189, 190.
[99] KEITH, Alexander. Signs of the Times, vol. 1, p. 307.
[100] Ibidem, pp. 308, 309.
[101] Ibidem, p. 309.
[102] Ibidem, pp. 311, 312.
[103] GIBBON, Edward. The Decline and Fall of the Roman Empire, vol. 5, cap. 50, pp. 86- 88.
[104] KEITH, Alexander. Signs of the Times, vol. 1, p. 312.
[105] Ibidem, p. 312.
[106] Ibidem, p. 313.
[107] GIBBON, Edward. The Decline and Fall of The Roman Empire, vol. 6, cap. 64, p. 226.
[108] Jorge Paquimeres: (Lê-se Paquímeres, e escreve-se, no original, Pachymeres). Jorge Paquimeres (em grego Γεώργιος Παχυμέρης, Georgios Pachymeres) (1242-1310 d.C.,
Constantinopla), foi um escritor e historiador bizantino. Nascido em Niceia, na Bitínia, onde seu pai se havia refugiado após a captura de Constantinopla pelos latinos em 1204. Com a expulsão dos cruzados por Miguel VIII Paleólogo em 1261, Paquimeres estabeleceuse em Constantinopla onde estudou legislação, ocupando depois vários cargos eclesiásticos e estatais (judiciais) importantes. Teve uma produção literária considerável, com a obra mais importante sendo a sua “História” de Bizâncio, produzida em treze volumes, na continuação da História de Jorge Acropolita, que relata o período de 1255-1308. Baseada principalmente em testemunhos e impressões pessoais, transmite muitos detalhes valiosos. Foi também autor de um “Quadrivium” (aritmética, música, geometria e astronomia) valioso para a história da música e astronomia da Idade Média. Pertenceu à comunidade religiosa bizantina, que lutava contra o pacto de união entre as igrejas ortodoxa e católica promovida por Miguel Paleólogo. Dele também se conservaram cartas e escritos retórico-filosóficos. Fonte: < https://goo.gl/JinoFn> (Enciclopédia Britânica, edição de 1913). Acesso em 11 set. 2015.
[109] POSSINI, Petri. Observationum Pachymerianarum, Livro 4 (Cronologia), Cap. 8, Séc. V.
[110] Ibidem, Livro 4, cap. 25.
[111] LITCH, Josiah. Prophetic Exposition, vol. 2, p. 181.
[112] Ibidem, p. 182.
[113] Ibidem, p. 182, 183.
[114] Ibidem, p. 183.
[115] Ibidem, pp. 183, 184.
[116] ELLIOT, Edward B. Horae Apocalypticae, vol. 1, pp. 478, 479.
[117] LITCH, Josiah. Prophetic Expositions, vol. 2, p. 189.
[118] LITCH, Josiah. The Probability of the Second Coming About 1843, p. 157
[119] Ibidem, pp. 192, 193.
[120] Morning Chronicle, de Londres, 18 de setembro, extrato de uma carta do correspondente datada “Constantinopla, 27 de agosto, 1840”.
[121] Como castigo da idolatria — “Eu prometo ao único Deus criador de todas as coisas, com o meu voto e o meu juramento, que não darei sono aos meus olhos, que não comerei nenhuns manjares seletos, que não procurarei o que dá prazer, nem tocarei o que é belo, que não voltarei o meu rosto do Oriente para o Ocidente até que derrube e pise debaixo das patas dos meus cavalos os deuses das nações, esses deuses de madeira, de bronze, de prata, de ouro, ou de pinturas, os quais os discípulos de Cristo fizeram com as suas mãos.” — Voto de Maomé II, publicado em todas as mesquitas em 11 de março de 1470; citado em “The Two Later Visions of Daniel”, Ver. T. R. Birks, M. A. p. 319. London: Seeley, Burnside, and Seeley, 1846.
[122] O nome desse soldado de baixa patente é janízaro.
[123] REDENBACHER, História universal, pp. 448-450.


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